Data de postagem: Nov 07, 2016 2:16:33 PM
Neste dia 5 de novembro Zélia Dendena Arnaud Sampaio esteve na Feira do Livro de Porto Alegre autografando o livro de Mario Arnaud Sampaio (in memorian) Vocabulário Português-Guarani, publicado pela Martins Livreiro.
Zélia foi homenageada pela ASSERS no último Encontro Estadual de Supervisores Educacionais.
Sabia que erva-mate é uma variação de uma palavra indígena? E que a palavra cacique não é indígena, mas árabe? Em uma tribo, quem comanda é chamado de tuxaua. Todas essas expressões fazem parte da miscigenação do brasileiro e são vocábulos da língua atual. Para que essas palavras e a língua oral não se perdessem, a obra de Mario Arnaud Sampaio foi compilada. Os responsáveis pela curadoria do material foram o professor da Édison Hüttner, coordenador do núcleo de Estudos em Cultura Afro-Brasileira e Indígena da PUCRS, Zélia Dendena e Raul Selva com colaboradores, entre eles Eder Abreu Hüttner e Marcia de Fátima Guedes.
"A obra de Sampaio, em folhas datilografadas (500 páginas) foram confiadas a nós por Zelia Dendena Arnaud Sampaio em 2005, por ocasião do Iº Fórum Internacional – Povos Indígenas: Terra, um lugar para viver ocorrido na PUCRS. De pois 11 anos de trabalho celebramos nosso objetivo: trazer ao público seus escritos e sua voz. O trabalho pautou-se pela manutenção fiel e valorização de suas palavras”. (Dr. Édison Hüttner – Coordenador no Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígena da PUCRS).
“Atualmente, vem crescendo de importância a obra do escritor, porque ganha espaço a ideia de que se leve às escolas também o conhecimento da língua indígena. E, em sua missão Mario Arnaud Sampaio é uma referência nacional expressiva”. Avelino Alexandre Collet (Academia Rio-Grandense de Letras).
o Vocabulário Português-Guarani faz coleção com o Guarani-Português. O guarani, em sua origem, era uma língua ágrafa, ou seja, com palavras somente pronunciadas. “A obra se torna muito relevante porque é original e mantém os estudos de Sampaio”, enfatiza Hüttner.
As obras juntas possuem mais de 48 mil vocábulos e 500 páginas que intercalam significados, expressões e explicações. “No material original, para cada verbete havia um parágrafo de explicação. Não somente o significado básico, mas também os sons da palavra, imagens, enfim uma ficha completa”, relata Selva sobre o cuidado de Sampaio para com o tema. Ele conta que qualquer dicionário oral está mudando constante, pela influência dos avanços tecnológicos. Assim, é importante que uma obra contenha todos esses radicais de pronúncia como o Vocabulário Português-Guarani.
“O vocabulário estava todo datilografado em um bloco de papel. Tivemos que passar para o computador, revisar e conferir. Todos trabalhamos como voluntários”, conta Hüttner. Além de manter a cultura viva, a ideia é homenagear o autor que tanto estudou sobre a temática. Mais de 200 reuniões foram realizadas entre os organizadores somente para a revisão do português.
Eles ainda levaram as palavras em uma aldeia indígena com professores, além de verificar outros vocabulários na internet. “Mesmo com nossa curadoria, tentamos manter o que o autor disse, não é uma obra acrescida”, enfatiza Hüttner. Ele conta que os textos de Sampaio circulavam em jornais nas décadas de 1940 e 1950. Isso fez com que o autor fosse considerado referência na área. Sampaio traduziu os vocábulos do espanhol para o português com as histórias locais na fronteira.
No Brasil são mais de 7 mil falantes. O Sul permanece com o original guarani. Mas regiões como São Paulo adquiriram transformações com o tupi-guarani. “Um exemplo conhecido é o nome de Cumbica para o aeroporto em São Paulo. Em indígena quer dizer neblina, pois a região tem essa característica. Se não houvesse estudos da língua, não se saberiam coisas básicas da região”, explica Selva.
O Vocabulário pretende ser um material de apoio para professores, alunos e escolas com o objetivo de disseminar a cultura indígena entre a população e até mesmo na literatura. “É uma obrigatoriedade do Estado, mas, por falta de material, não é ensinado aos estudantes”, ressalta Selva. A obra será distribuída gratuitamente e pode ir além do ensino da língua guarani. “Até mesmo a revisão de conceitos ambientais, do significado de nomes de plantas e raízes, pois quase todas têm uma origem indígena”, exemplifica.
Para os organizadores, pouco se conhece dos indígenas guaranis. “Qual era a principal fonte de leitura deles, que biblioteca tinham, liam as plantas das árvores, os chás?”, questiona Hüttner. O livro quer trazer uma possibilidade de conhecimento para todas as áreas de estudo, como idiomas, humanas e ciências. “Hoje em dia, para ensinar a língua teríamos que trazer alguém da aldeia”, enfatiza Selva.
Na imagem, Édison Hüttner (E), Zélia Dendena e Raul Selva
Um pouco sobre Sampaio
O indigenista Mario Arnaud Sampaio dedicou sua vida à defesa do índio e de seus direitos. Nasceu em Barreiras (Bahia), em 1902. Chegou ao RS em 1924, onde criou raízes e tornou-se “gaúcho por opção”. O contato com o Posto de Nacionalização Indígena, em Cacique Doble, e o Posto Indígena de Inhucorá fizeram com que aprofundasse seus conhecimentos sobre o linguajar guarani.
Foi poliglota, autodidata e tradutor. Falava, além do guarani, espanhol, francês, italiano e esperanto. É uma das referências sobre o estudo do idioma. Fez mais de 300 palestras sobre a cultura indígena em escolas e instituições sociais. Hoje sua obra é a principal memória sobre a língua.
Fonte do texto e imagem, Revista PUCRS